terça-feira, 18 de dezembro de 2018

"Estatística Jabuticaba"


"Estatística Jabuticaba"

Estatística é uma ciência fundada em cálculos matemáticos que representa dados referentes à frequência de ocorrência de eventos, através de observações coletadas ou experimentos de forma a quantificar um acontecimento ou possibilitar a previsão de fenômenos futuros, servindo de base para adoção de medidas de interesse do estudo realizado, bastante recorrente na Administração Pública.

A Administração Pública pode e deve se planejar com base nos dados estatísticos de forma a produzir conhecimento e estimar suas ações com planejamentos adequados e transparentes, proporcionando maior vazão às suas demandas de forma a coincidir com o interesse da sociedade, que percebe os dados através dos efetivos resultados, consoante com o art. 37 da Constituição Federal do Brasil que estabelece princípios norteadores que, dentre outros, destacam-se a impessoalidade e eficiência de forma a banir da administração a autopromoção e a falta de resposta estatal às mazelas que assolam a sociedade.

Com o passar dos anos a estatística tornou-se uma ferramenta de poder para burlar os objetivos da Administração Pública em se antecipar aos fatos e prever a forma de prestação de serviço mais adequada, corroborada com a necessidade de destaques classistas, de disputas internas de cargos, da necessidade de divulgação de dados independente de resultados reais, utilizando-se dessa ciência para status de poder, desvirtuando-a da finalidade de informação, que impregna órgãos como as instituições de segurança pública, através do estabelecimento de metas pelos Dirigentes, sem aferição do equilíbrio da quantidade com a qualidade.

As chefias perceberam que poderiam usar os dados estatístico para demonstrar “eficiência”, e o modismo de quantificar se alastrou nas repartições, delegacias, superintendências, que ao contrário do interesse em semear a paz social com o combate ao crime, resolveram demonstrar sua capacidade de operacionalidade através de índices de produtividade (quantidade de atos realizados) e não da efetividade desses atos, computando o número de operações, perícias realizadas, atendimentos, relatórios, acionamentos, intimações e não a quantidade de respostas satisfatórias ao cidadão que teve seu bem lesado.

Para aferição dessa assertiva, basta pegar uma Superintendência ou Delegacia que tenha o maior número de ações/operações em um ano e através de uma auditoria simples constatar quantos processos finalizaram com denúncias, ou quanto de entorpecente foi apreendido por ação ou quantas armas retiradas de circulação, ou qualquer outro parâmetro que constate a efetividade das ações da localidade “elite” em números contabilizados, que provavelmente serviu de orgulho para o brilhantismo das chefias e promoção do órgão, contudo, sem efeito social em afronta aos princípios constitucionais.

Isso demonstra que os números também podem ser manipulados a depender do interesse, fazendo com que a ciência exata se torne aliada da pessoalidade, com índices e fundamentos embasado no interesse classista ou pessoal, se tornando ferramenta de poder enquanto os mais necessitados naufragam na lama do crime.

Enquanto os órgãos implementam mecanismos de contabilização e se entopem de dados/índices desconexos de ações eficazes e se maquiam para divulgação, a sociedade tem de conviver com os números e gráficos da realidade, com cercas, vidros, arames, eletricidade, mudanças de horários, privações, enclausuramento, perdas, corpos, lesões de toda espécie, com crescente ascensão dos ponteiros do “criminômetro”.

Enquanto se envereda essa guerra de informações e vaidades, a falta de medidas eficazes impõem o pânico à população como subproduto, que consequentemente, mascara as soluções dos governantes, remetendo à necessidade de respostas concretas e efetivas de revisão de todo o sistema, combatendo o oportunismo e os interesses privados que precificam a segurança e a ordem pública, repassando à sociedade o preço da incompetência do estado, que apenas protege a parcela mais abastada da população, remediando seus efeitos sem atacar a causa da desordem pública, criminal e administrativa do estado em relação à segurança pública, maculando o Estado de direito democrático e favorecendo a desigualdade e a desestabilização social.

O Estado foi constituído devido à necessidade de ordenar a sociedade e oportunizar condições para o indivíduo poder exercer com plenitude sua cidadania e prover-se de alimentação, saúde, educação, lazer, segurança, proporcionando a elevação da estima e a realização pessoal que consequentemente reflete numa sociedade pacífica que previne e repele o crime e a desordem, propiciando o bem-estar e o progresso social com a regulação de fatores que evidenciem a segurança. Para tanto, necessita de controle, limitação das liberdades individuais, normas objetivas e eficazes, minimizando os riscos e construindo uma segurança pública sólida e confiável; ações que promovem o país mundialmente, para isso necessita voltar ao monopólio da segurança pública e não ficar refém de interesses classistas.

As autoridades dispõem dos mais variados estudos e exemplos de estruturas policiais no mundo que comprovam a evolução dos riscos e a necessidade de reestruturação da metodologia adotada na prevenção e investigação criminal brasileira. Tomando como referência o cenário de transformação na economia mundial, alavancado pela sofisticação tecnológica, a globalização, a transmutação do crime, impõe-se a necessidade de aprimoramento do serviço de inteligência para a prevenção e o combate à criminalidade regional e às vertentes globais como os grupos terroristas; o Brasil, em termos de horrores, não passa vergonha nas manchetes mundial em relação às atrocidades cometidas no cenário interno, que vão desde organizações politicamente articuladas e engajadas socialmente até às facções criminosas como PCC, CV, Sindicado do Crime e diversas outras siglas criminais estabelecidas no território nacional, muitas com características transnacionais, exigindo do Brasil respostas eficazes, combate uniforme e até cooperação internacional, que poderão ser bem articulados através dos dados estatísticos responsáveis.

Contudo, se utilizarmos os dois dados que mais trazem orgulhos para as instituições policiais: índices de operações realizadas pelas polícias, ou índice de inquéritos relatados, constataremos a falência dos órgãos de segurança, a falta de otimização da mão de obra, o isolamento das forças policiais na contramão das políticas internacionais, a falta de essencialidade do trabalho de inteligência, do compartilhamento do conhecimento para nortear as decisões, falta de um legislativo preventivo, investimentos insuficientes, imposição dos interesses privados em detrimento ao público, a desvirtuação da essência de Estado,  a necessidade  de reestruturação das diversas polícias com integração e mutualismo envolvendo o judiciário, a não independência investigativa, falta de políticas de complementariedade dos diversos conhecimentos produzidos voltada ao intercâmbio nacional e internacional com acordos direcionados ao combate uniforme à criminalidade.

Diante todo o exposto, sugere-se parcimônia e comedimento no estabelecimento dos critérios e aferições dos dados estatísticos, para de forma responsável a Administração poder se enxergar e responsavelmente estabelecer critérios para resguardar os direitos básicos com o vi reestabelecimento da ordem pública e da paz social, harmonizando a informação com a realidade vivenciada pelos oprimidos.

Autoria: ANEPF - Associação Nacional dos Escrivães de Polícia Federal
Dezembro/2018

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